de dezesseis de setembro a quatro de julho, pouco menos de dez meses de pura afonia escrita. houve de tudo, do céu ao inferno, da direita à esquerda, do sono à vigília. marcas tristes no decorrer de uma vida um pouco estreita de mais, brilhante de menos. entretanto, se eu voltar a escrever depois de dez meses é provável que eu não tenha mudado tanto os temas sobre os quais penso e escrevo. pois faço curvas e curvas, subo e desço, às vezes eu paro, mas alguma impregnação - como uma imantação - me mantém estreito e opaco. depois de onze anos, não é anacrônico e, quem sabe, moralmente reprovável manter um weblog no qual a única narrativa é a minha própria sobre o mundo? é o mundo e as pessoas a partir de mim? é desde esse perspectivismo que tudo se desdobra? há outra narrativa possível? sou chato, mas um chato calado, diferentemente do homem sentado agora ao meu lado em um café, num dia frio, que não para de falar nos estados unidos (sobre "como lá o atendimento em bares é melhor", sobre "como o transporte lá é melhor", sobre "agora foi comprovado nos estados unidos que o ovo faz mal", sobre "eu vou voltar pros estados unidos, só estou esperando o momento certo"). seu tema é irritante e seu sotaque arrastado de portoalegrense descolado contribui para o cultivo de um desprezo por aquilo que fala e como fala. o fato de ele não ouvir, absolutamente, a mulher com quem ele divide a mesa, só reforça o que seu monotematismo grita: o mundo se desdobra a partir dele próprio, e a sua narrativa é a única que importa. não quero ser ele, e seu eu for, prefiro ficar meses em pura afonia.