Zelo

[...]mpre o mesmo banco, mas nunca os mesmos homens. Porque eu passo correndo por ali, literalmente correndo, e vejo aqueles homens sozinhos, insulares, sentados nos bancos e se articulando através de olhares que te escaneiam. Centopeias oculares, flexo e reflexo. Eu poderia passar por ali dois séculos depois de hoje e eu ainda acharia rastros desses olhares – sem dúvida não acharia os mesmos homens, tampouco o mesmo jogo de flexo e de reflexo, mas eu acharia algo todo novo e inusitado que, de certa forma, seria um quê herdeiro dessa disponibilidade, dessa disposição, dessa inquietude dos homens que se sentam naquele banco. Uma beleza tardia se despencou na minha frente: nunca a supus, e quanto tempo perdi procurando-a e produzindo-a sentado num banco que nunca mudava. Sem medos ou esperanças: o que se faz diante dos meus olhos? Aquilo que se arrisca no olhar, aquilo que fulgura; aquilo que impede Narciso de apaixonar-se à beira do rio. É uma água turva, movente, que bloqueia qualquer marasmo ou estado plácido de calmaria que transforma a superfície da água em espelho – nunca haveria de refletir rosto nenhum. E, quem diria?, uma parte toda lisa de mim te absorve e te reflete, te irradia. Flexo e reflexo. É mentira que as pessoas deixam o céu aberto porque não querem se molhar: é a chuva que chega e que se gruda nos corpos querendo ir embora das nuvens. Nunca percebeste? Então vem, te gruda em mim, corre no meu entorno, que eu te espero com zelo sentado naquele banc[...]