Pôr-se à vista. Comprar roupas justas, de cores lisas e tecidos inteligentes (que pensam pelo corpo, no lugar da pele). Esperar o olhar, esperar o ônibus, esperar belo. Aguardar o pouso do olhar na pele, digo, no tecido inteligente. Senti-lo queimar, grudar mais na pele, embrulhar a pele como se a pele já fosse subcutânea. Pôr-se à vista e esperar o olhar pousar, raspar, tocar, fazer cócegas. Comprar um par de tênis inteligentes que propulsionam os calcanhares. Jamais tocar o chão. Posar e aguardar o pouso do olhar nos tênis inteligentes, que guardam pés bem hidratados. Ninguém verá os pés hidratados. O tênis inteligente vale mais que os pés hidratados; pés hidratados não vão além, não saltam, não amortecem. E no que se trata, ou quer se tratar, de hidratação, fazer balançar ao vento os cabelos também hidratados, bem cortados, brilhosos, estupefantes. Comprar shampoo inteligente que desembaraça os fios, que os reveste de uma camada de microespelhos: shampoo que pensa pelos cabelos, que os reveste, que os encapsula. Posar a cabeça imóvel na quina onde o vento ricocheteia e deixar os cabelos dançarem. O sol iluminando os fios na perpendicular, uma cabeça reluzente, porém não pensante. Quem pensa é o shampoo. Aguardar a vista, aguardar o olhar. Depilar o saco escrotal com cuidado, aparar os pelos pubianos. Envolvê-los em cuecas de tecido inteligente (um tecido que pensa pelos pelos, pelo saco escrotal, que pensa no lugar dos testículos). Aguardar a vista, esperar arrancar.