já fui mais aguerrido, é verdade. mais inconformado, mais revoltado e, por isso, mais ativo. por vários momentos, reativo; ainda assim, mais móvel e inquieto. hoje valso mais na reticência. não estou empacado, nem regredindo. estou sendo puxado pelo tempo presente, por ora no redemoinho do presente contínuo. é um estranho fluir sem pressa ao qual estou e sempre fui pouco afeito. em setembro, Porto Alegre ganha cores lindas com o florescer dos jacarandás e ipês. me sinto um pouco como a cor das flores dos jacarandás e dos ipês: um instante que não age para deslocar-se e que desliza num agora duradouro, caindo das árvores e reaparecendo em intervalos mais ou menos calculáveis. não sei se essa forma de existir é mais conforme aos trinta e seis anos que adquiri há pouco; afinal, são os jovens que buscam. eu parei de fazer projetos e de querer coisas do futuro - de ver coisas no futuro. tenho dificuldades em retomar o curso da vida ao projetar objetivos, estabelecer metas para alcançá-los ou, simplesmente, imaginar-me em outro país ou em outra cidade, com outra profissão. em outro corpo. eu não busco mais, nem sou buscado. desisti, em dois momentos, de mudar de vida, de cidade e de país. talvez minhas chances esgotaram, e nunca fui bom em ter chances - ou eu de fato aos aproveitei quando as tive. chances não são renováveis. chances não são créditos que uma ou várias boas ações compram ou fazem acontecer. as minhas chances foram flores de ipê ou de jacarandá que floresceram apenas uma vez, e eu as contemplei com a cabeça apoiada em uma das mãos, sorrindo, até que caíssem intocáveis no chão. é uma tranquilidade triste de um permanente por-de-sol de um domingo frio.