passei um longo período sem escrever, sem girar a roda, sem empurrar a engrenagem, sem movimentar a cadeia. de certa maneira censurei-me por isso, ou lamentei. até que resolvi escrever definitivamente, com sangue, em meu corpo. escolhi vinte e cinco palavras de um texto escrito por mim, de meu próprio punho e de minha própria imaginação, para deitarem na minha pele. vou tatuar nas minhas costas uma frase de um dos meus textos. quando tomei a decisão, excitei-me como se tivesse acabado de escrever um romance, um romance honesto. é que eu serei inteiramente as antessalas e as portas que precedem e que sucedem cada uma das vinte e cinco palavras que vou tatuar nas minhas costas. os caminhos que giram a roda, que empurram a engrenagem, que movimentam a cadeia estão em mim. meses sem escrever uma palavra que fosse, sobre mim ou sobre qualquer outro, e acabei por querer marcar meu corpo com minhas palavras. escolhi uma frase na qual eu não caibo inteiro: minha inteireza está na escolha estratégica dos sentidos de cada uma das vinte e cinco palavras tatuadas no meu corpo – nas antessalas que as precedem, nas portas que as sucedem. por ocasião da escrita de tal frase, senti a excitação de reconhecê-la como tatuável: um mapa labiríntico daquilo que eu sou. convido-os para entreter nos pequenos vinte e cinco espaços antecedentes e convido-os a avançar as portas dos fundos de cada palavra tatuada.

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