o dia bonito e quente poderia terminar com uma/várias cervejas geladas! mesas na rua, olhares solícitos, vento, conversas do grupo de trás e ao lado entrecruzadas com as nossas. a confusão é agradável, estimulante. tudo pode acontecer num fim de dia belo e quente. é possível até mesmo estender a mão e tocar em corpos disponíveis. se isso não acontece, é hoje permitido imaginar essa cena, sonhar com ela: tocar em corpos, deslizar a mão sobre eles. ainda não conseguiram impedir que imaginemos as línguas roçando, o que já é um alívio. mas está chegando a hora de uma censura algorítmica cuja interdição nós receberemos sem compreender e, portanto, sem questionar (nenhuma censura é totalmente compreensível e nenhuma é inteiramente questionada). essa censura estará presente até na mesa do bar, até no final do dia bonito e quente, até na cerveja gelada. e as ruas já não serão mais que passagens; e os olhares já não serão mais que meros reconhecimentos faciais; o vento, uma brisa individual e costumizada, controlada por aplicativos; e as conversas serão "conversações em rede", comportadamente técnicas. apagar-se-ão a confusão e o caos, e o babelismo com o qual brindamos o final de dias quentes e bonitos será substituído por uma organizada alocação de corpos cujas interações obedecerão lógicas paralelas e diagonais, de ponto a ponto, criptografadas. sem mais toque, sem nenhuma disponibilidade dos corpos em serem tocados randômica e inesperadamente, acostumados de forma triste à frieza técnica da "conversação em rede", nem mais a imaginação das línguas roçando será viável. essa cena terá desaparecido das lembranças, memórias, tradições, mitos e lendas. por que imaginar algo que já não estará na borda daquilo que é possível acontecer? aí, então, a cerveja será substituída pelo relaxante muscular.