Meus e maus lençóis

Eu decidi que amanhã eu vou trocar os lençóis da minha cama e tudo mais que vem junto deles. Enquanto arrumava minha cama fiquei pensando nas células mortas do corpo que semana passada deitava ali – e não falo do meu –, o que me causou profunda aversão. Não do corpo que ali pesou, mas das células mortas que ali jazem. Vou pôr tudo pra lavar. Mas antes sou capaz de rasgar os lençóis e chamá-los que covardes, de medrosos, de burros e de insípidos. Gritar com os lençóis, filhos de uma cadela vadia cheia de doenças, filhos de um porco nojento mentiroso, cretinos, ordinários, cuzão, imbecis. Até ejacular sobre eles eu sou posso. E no fim da convulsão posso olhar pra eles e dizer, tomem agora e sintam o que perderam.
Eles são verdes, os lençóis. Mas deixarão de ser. Porque estou com uma compulsão por limpeza, quero desinfetá-los, estou obcecado pela sua assepsia. Pois vou deixá-los de molho na água sanitária, e vou aprovitar pra limpar o banheiro jogando água sanitária por todo ele. Obsessão pela assepsia de todos os espaços onde podem haver células mortas do corpo - e não falo do meu. Esfregar meu peito com esponja, lavar minha cara com água sanitária, tomá-la. Apagar qualquer resquício, desinfetar, limpar, deletar. Vou começar pelos lençóis.