Hoje eu calcei teus sapatos e andei por quilômetros, sem meias.
Soube de todos os teus segredos e das perguntas que tu nunca quis fazer.
Apertaram-me os sapatos, e bolhas doeram nas laterais dos dedos.
Andaria novamente amanhã seu eu pudesse. E posso.
Calcei teus sapatos para andar, para ir até lá, para percursionar, para incursionar nos teus pés.
As bolhas doem, mas não não meus pés.
Meus pés já fazem parte dos teus sapatos.
Tua calçada é outra, contudo.
Contemplo meus pés machucados pelos teus sapatos.
Agora não temos mais como mentir. E não mentimos.
São apenas sapatos e pés, e bolhas, e dores. Diferentes calçadas.
Nossos dedos e nossos calcanhares andaram pelo mundo na mesma sola.
Não há segredo maior do que aquele dos pés doloridos.
A intimidade dos cadarços, das palmilhas; intimidade andarilha.
Eu sei onde aperta teu sapato. E aperta.
Descalcei teus sapatos e os abracei.
Doem as bolhas dos meus pés, mas eu sei das tuas perguntas não feitas.
Quanto tu calça? Tu calça o tamanho dos meus pés sem bolhas.
Hoje foi dia de saudade.