eu não sei se está chovendo lá fora. gostaria de dormir com chuva, com o som dos pingos na janela, nos carros e nas árvores. sinto um aconchego tremendo ao saber da água no lado de fora. dou-me conta de que essa sensação de aconchego é inseparável da segurança e proteção que sempre gozei. sempre tive casa, sempre tive quarto, sempre tive cobertores. sempre tive uma pele sedosa, que só agora começa a enrugar. cogito me levantar e ir até a sacada para verificar se chove mesmo. quero a comprovação. mas do que me servirá a comprovação - de que chove ou de que não chove? decido não ir até a sacada. escolho acreditar que está chovendo. se eu eventualmente verificasse que não está chovendo, eu teria de lidar com a frustração. é um pouco este o exercício geral: desistir da verificação, escolher acreditar no que aconchega e evitar a frustração. já tenho rugas demais para ter que aceitar que não chove, e que não posso fazer chover.