Hora do cometa

Eu, Macabeu, fantasio com você-vocês. Não me orgulho disso, não me satisfaço. Procuro satisfação em outras zonas, territórios menos combativos e mais urgentes. Profiláticos. Mas, sim, existe uma delícia ao me deitar na cama e manuseá-los nos dedos, tê-los comigo nas produções minhas. Existe um sabor denso em manipulá-los, em fazê-los dizer o que quero, em movê-los para cá e para mais cá. Não é ridículo, é só um jeito entre tantos este de colocá-los numa roda giratória dos profanos. Saberão você-vocês que andarão pelos meus pensamentos? A mim retorno sempre que posso, e sempre é necessário voltar. Para cultivar e manter aqui e ali essa vontade, essa energia que me faz buscá-los na rua e trazê-los para casa. Para dobrar novamente minhas roupas usadas e deixar apenas as cuecas penduradas, estendidas sobre a escrivaninha, deitar sobre elas e cheirá-las – porque é doce seu cheiro. Para me esfregar nas paredes e descer até o chão em forma de concha. Para lambê-los e odiá-los gozando, para insistir nele-neles, para ouvi-los gemer. Se não tiro o pó dos meus móveis é porque quero que o pó seja minha testemunha: sou feliz na hora do cometa. Trago todos ele-eles comigo porque quero, porque me são preciosos, e não porque me são precisos. O cheiro de cerveja, da dose dupla de vodka. O bafo quente do cigarro recém apagado. Os cabelos desgrenhados do sexo selvagem de logo antes. Nenhum dele-deles bebe, nem fuma, nem tem cabelos. Nenhum deles faz sexo. Sou eu quem faz com ele-eles. Não é triste nem sofrido, é só mais um dos jeitos que achamos para continuar desejando, e ao desejar sempre mais e mais e mais trancar a porta para que não se vá o desejo, para segurá-lo, girar a chave, segurar as janelas, fechar as torneiras. Então tomar banho ainda vestido e secar-se! Olhar-se no espelho e continuar desejando, ai, será difícil? Tocar-se. Deitar na cama e apagar a luz, e afundar a cabeça nos travesseiros. Sentir a dor nas costas. Voltar a fantasiar com ele-eles.