ninguém volta pra casa sozinho. ninguém faz sozinho da tenda uma casa. não consigo amar dois homens ao mesmo tempo. não esqueço desprezos, nem rejeições. preciso diminuir o cigarro. já tenho um plano de saúde privado. odeio crianças dentro de aviões. poucas foram as vezes em que tive uma casa. nunca casei. nunca amei - melancólico é o pai cujo filho não é capaz de amar. quase sempre chorei quando afirmei que me sentia mais feliz por um ou dois segundos. e quase sempre foi mentira, e quase sempre durou menos que aquilo. detesto trabalhar depois das 19h. estendo a roupa lavada no varal, mas gosto mesmo é de passar camisas a ferro, na tábua - ninguém entende isso. já me senti o último homem assistindo ao por-do-sol. nunca desejei a fama, nem o brilho. não sou imprescindível pra nada. família sempre foi um dever. amizades se tornaram menos mistério com a idade. a velhice, um espinho. o corpo é o tempo presente que se desgasta, pedra de areia na margem do rio em erosão. não extraio prazer da dor, nem da humilhação. minto e me envergonho. quero mais da vida do que ela é hábil em me dar. não lembro dos meus sonhos - fria é a mãe cujo filho não lembra dos seus sonhos. pouco sei sobre o porquê de eu estar aqui do jeito como estou. tentei poucas vezes de quase tudo, e quase sempre deu errado. o que deu certo me manteve vivo. por isso sou eu quem percorre o vão entre as torres gêmeas sem cabo de segurança.