Depois do silêncio

[...] (silêncio). Um cansaço, sabe? Só de pensar, de imaginar, só de vislumbrar aquelas pessoas todas que retornam, suas roupas e o tom das suas vozes. Um cansaço, uma contrariedade. E quando fui me dando conta do incômodo, eu fui me calando e ficando quieto, cada vez jogando mais longe meu olhar naquele horizonte de dois azuis bem distintos, perfeitamente reto, do encontro do mar com o céu. “Vem, vamos, há muito ainda o que fazer, há muito ainda que trabalhar, há pessoas que precisam de ti”. E eu não quero ir, vou arrastado com as mãos atadas, puxado pelo nó que as imobiliza. Foi de uma revolta e de um deboche sem iguais: “E o Troféu Piroca Verão 2011 vai para... o Mineiro! O Mineiro ali de sunga preta com detalhe vermelho! Parabéns! Aqui está o Troféu, um falo feito de gesso banhado a ouro 18 quilates, glande cravejada de rubis bem vermelhos, veias desenhadas com pedras lápis-lazuli, saco delicadamente trabalhado em duas pérolas gigantes e espirrando sêmen em cascatas de brilhantes! Agora larga essa mocreia loira que não dá nem pra fazer faxina lá em casa e vai ganhar o mundo!”. Silêncio, isso sim. Eu fui obrigado a apenas construir esse e outros textos mentalmente, sem mexer sequer os lábios. E construí, ei-lo aí. Talvez minha dor no estômago se deva ao fato de eu ter que engolir minhas palavras que, prestes a tomar voz, eram deglutidas a força. Meu silêncio não era um nada, uma letargia neutra. Eu não sou neutro. Meu silêncio era minha úlcera fervendo no estômago cheia de ironias e sarcasmos, histórias fantásticas de humor sexualizado. O próximo passo é o vômito. (silêncio) [...]