Todas as fases do Fim - A Vingança, parte 7

“A gente se fala” ele disse. “Ainda bem que a gente é pós-moderno” eu falei “porque se a gente fosse moderno, tu nunca ia poder dizer ‘a gente se fala’ depois de ter dormido comigo pelado na mesma cama e depois de ter me dito as coisas que tu me disse hoje”, “hahahahaha, é verdade, e o que a gente deveria fazer se a gente fosse moderno” ele perguntou, “a gente teria de ficar pra sempre junto”. “Hahahahaha, ta bom. Viva a pós-modernidade. Abraço!”. “Viva. Viva a pós-modernidade” eu disse bem baixinho, ele nem escutou porque tinha muito movimento de trânsito na João Pessoa.

Eu me virei e fui voltando com passos calmos. Eu estava calmo, sabe, tranqüilo, um pouco tonto, mas eu sempre fico assim quando eu choro muito. ‘Viva a pós-modernidade’, aquela frase na minha cabeça, ‘viva, viva a pós-modernidade’. Aí eu me virei. Só deu pra escutar o barulho do corpo loiro de olhos verdes batendo contra o ônibus que ia do centro pra zona sul. Bah, voou longe, acho que uns dez metros, sei lá. Rolou pelo canteiro da rua, parou no chão e ele não se levantou. Um tumulto de gente em volta, carros e outros ônibus parando, pessoas nas janelas dos prédios ali em volta. Até os garçons do Van Gogh, sabe ali o Van Gogh? Na esquina da João Pessoa com a República? Pois é, até os garçons vieram correndo ali tentar ajudar, tentaram mexer nele e tal. Pensei “se eu correr, ainda consigo pegar alguns dentes no asfalto pra guardar de lembrança”. Mas não, eu tinha que entender o desapego às coisas – e às pessoas. Era melhor eu voltar pra casa pra limpar meu vaso sanitário, que estava um horror de tão sujo, diga-se. Ah, não, amiga, não me sinto culpado, não. Era a hora dele. Culpa é ele que deve estar sentindo agora, e remorso, porque eu to aqui, bonita, pronta pra pegar os carinhas sarados da Redenção. E ele? Pois é... Sabe-se lá onde, né...
FIM