vivendo de todas as expectativas, as apostas: sou um jogador. esvaziando as razões pelas quais se pode viver não se vive mais. e há razões. não tive coragem de dizer a uma amiga que penso na morte causada todos os dias. minha amiga é muito viva. não penso na morte causada como um drama, como uma vingança; penso a morte causada como um fim pragmático. não estou certo, contudo, de que qualquer fim da vida possa ser considerado pragmático. não me parece que é dessa forma que a vida se finda em si mesma. é possível imaginarmos que a vida quer acabar consigo? ou a vida vai deixando de querer, aos poucos, até que desiste? "esvaziando", eu pensei hoje enquanto dirigia. mas ainda sim em pé, como um boneco que se mantém pelas dobras, não por estar inflado. esvaziando do engano, da cena, do drama. um personagem que morre, cuja vida vai desistindo dele. e outro que revolve dentro da pele podre desse ator maldito, feto inesperado, que diz: "haja tudo em meu caminho, por tudo haverei de passar, e haverá morte onde precisar haver, pois nenhum obstáculo precisa ser intransponível, nenhum corpo há de ser imortal, tudo deve perecer e saber sorrir quando é chegado seu fim".